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Alimentos orgânicos são mais caros. Por quê?

Quem nunca ouviu ou falou que alimentos orgânicos são caros? Mesmo reconhecendo o potencial benefício de ter um alimento mais saudável, sem risco de contaminação por agrotóxicos ou com excesso de adubos químicos, é altamente provável que os leitores já ouviram ou falaram que os alimentos orgânicos são caros. Então, se os alimentos orgânicos são caros, são caros por quê?

Como em qualquer moeda que tem duas faces, se o produto orgânico é caro, é porque o produto convencional é barato. De fato, sucessivos governos incentivaram num passado recente no Brasil a produção de alimentos baratos para a população com baixo poder aquisitivo. A abertura do cerrado brasileiro foi realizada com o incentivo governamental numa época que as atuais questões ambientais não eram consideradas.

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Outro ponto é o conceito de produtividade que deixou de ser produção por área para ser produção por área por tempo. Na área agrícola, passamos a buscar cultivares cada vez mais precoces e produtivas. No caso das hortaliças, quando isto não era suficiente, passamos a utilizar mudas produzidas em bandejas de isopor para reduzir o ciclo de cultivo a campo. Não contentes com os ganhos em produtividade, passamos a utilizar sementes pré-germinadas (priming) para acelerar ainda mais o sistema produtivo, aumentar a uniformidade da germinação e reduzir falhas.

Na área animal, buscamos ganhos genéticos em nossos rebanhos e confinamos os animais para aumentar a produtividade e precocidade. Talvez nada exemplifique melhor do que fizemos com o frango de granja, cuja produção demorava cerca de 60 dias nos anos 1980 e atualmente demora em torno de 45 dias. E estamos fazendo com o gado de corte, os peixes e tantos outros animais dos quais retiramos produtos que utilizamos para alimentar as pessoas.

Consequentemente, produzimos alimentos cada vez em maior quantidade e a baixo preço para sustentar 7 bilhões de pessoas no planeta Terra. E não paramos ainda de agregar tecnologia para aumentar a produtividade.

Em reação ao sistema tecnológico conhecido como “convencional”, começou-se um movimento na década de 1980 para resgatar a forma de produção de alimentos que fossem mais seguros para o ambiente e para quem os consome. Estes são os alimentos orgânicos, conforme estabelecido pela Lei 10.831/2003. Os alimentos orgânicos são mais caros do que os convencionais por pelo menos sete razões que passamos a relacionar a seguir.

A primeira é a certificação. Para serem comercializados, os alimentos orgânicos precisam ser certificados. O agricultor orgânico precisa provar que o que produz respeita todas as normas da produção, a legislação trabalhista e ambiental. Ele pode escolher entre três opções que a legislação permite: contratar uma empresa para fazer a certificação, organizar-se com seus vizinhos em um Sistema Participativo de Garantia ou cadastrar-se no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – Mapa, para, por meio do Controle Social, fazer a venda direta sem certificação. O agricultor convencional não precisa nada disso.

A segunda é o período de conversão da área e a barreira de isolamento para vizinhos não orgânicos. Para iniciar a produção orgânica, a maioria das propriedades precisa passar por um período de adequação conhecido como período de conversão. Neste período, que pode durar alguns anos, conforme normas do Mapa, a produção não é mais feita pelo sistema convencional, mas ainda não pode ser vendida como orgânica. Portanto, o agricultor normalmente vê sua produtividade habitual reduzida e ainda não recebe o valor adicional de um alimento orgânico.

Além do período de conversão da área a que todos os novos agricultores estão sujeitos, muitas propriedades, por estarem inseridas em áreas com produção convencional em seu entorno, precisam instalar e manter barreiras com os vizinhos convencionais. A barreira tem a finalidade de evitar a deriva de agrotóxicos provenientes do cultivo convencional, e o deslocamento de pragas e doenças que normalmente estão em desequilíbrio no vizinho convencional.

Portanto, o agricultor orgânico tem que reservar uma faixa sem produção no perímetro de sua propriedade para garantir a qualidade de sua produção orgânica. Esta terra improdutiva não gera receita e, portanto, deve ser computada no custo de produção dos alimentos orgânicos. Isto é especialmente significativo para agricultores familiares que dispõem de pequenas áreas para produzir nossos alimentos orgânicos e sustentar a família deles.

A terceira razão para os alimentos orgânicos custarem mais do que o similar convencional é a maior demanda de mão de obra. Na agricultura orgânica trabalhamos com compostos orgânicos, que requerem mão de obra para ser compostados e distribuídos nas áreas de cultivo.

As opções para mecanizar algumas atividades normalmente não são economicamente viáveis em pequenas propriedades familiares. Aliado a isso há também a baixa retenção dos jovens na atividade agropecuária, pois estes são atraídos pelo estilo de vida urbana e partem para as cidades para estudar, trabalhar e constituir família, fazendo questão de esquecer a origem de suas famílias, de nossas famílias. A lei de oferta e demanda funciona também para a mão de obra no cultivo dos alimentos orgânicos. Ou seja, só se consegue manter a mão de obra se esta for mais bem remunerada pelo seu serviço. Isso onera o custo de produção dos alimentos orgânicos.

Em quarto lugar, relacionamos a produtividade e a escala de produção menor do cultivo de alimentos orgânicos em relação ao cultivo convencional. A produção por área nos dois cultivos não é significativamente diferente. O que desequilibra a relação da produtividade na agropecuária atual, expressa por produção por área por tempo, é justamente o tempo de produção. O ciclo de produção de vegetais ou de formação de animais é maior no sistema orgânico em relação ao convencional.

Pelo fato de não utilizar adubos prontamente solúveis para as plantas e promotores de crescimento na ração dos animais, estes demoram mais para atingir o ponto de maior desenvolvimento para a colheita ou abate. Portanto, por este aspecto os alimentos orgânicos precisam de um valor maior do que o convencional para equilibrar a receita entre os dois sistemas.

O sistema orgânico pode ser diferenciado do sistema convencional pelo número de culturas cultivadas ao mesmo tempo em uma área. O maior número de culturas (policultivo) recomendado para o sistema orgânico contrasta com o cultivo de uma única variedade (monocultivo) do sistema convencional. Por esta razão, o cultivo orgânico perde rendimentos de escala, pois, quanto menor a quantidade produzida de produto por área, maior o custo de produção.

Uma lei de mercado aparece em quinto lugar nesta relação de motivos. A oferta e demanda são implacáveis. Quanto maior o preço de um produto, mais quem produz quer ofertar ao mercado. Por outro lado, quanto menor o preço, mais o consumidor quer comprar. A conscientização na última década sobre questões ambientais e de saúde só faz crescer a demanda por alimentos seguros e saudáveis. Como o setor produtivo não oferece produtos na mesma velocidade que cresce a demanda, é natural haver um sobrepreço no produto em qualquer área que seja regida pelas forças de mercado. Para os orgânicos isso não é diferente.

A assistência técnica deficiente ou inexistente é o sexto motivo. Os agricultores orgânicos estão praticamente abandonados à própria sorte. A assistência técnica oficial para o cultivo de alimentos orgânicos e mesmo para o cultivo convencional foi desmontada pelos governos estaduais nas últimas gestões em praticamente todos os Estados do Brasil.

No cultivo convencional, a assistência técnica passou a ser feita pelas revendas agropecuárias com o interesse de vender aos agricultores o pacote de insumos das empresas por estas representadas. Quem não compra insumos (adubos químicos, agrotóxicos, sementes transgênicas, entre outros) não recebe assistência técnica. Portanto, os agricultores de alimentos orgânicos estão fora deste mercado. O número de consultores autônomos que prestam assistência técnica ou consultoria para produção orgânica ainda é pequeno e insuficiente para atender ao crescente mercado de alimentos orgânicos brasileiro. Sem assistência técnica fica mais arriscado e caro produzir alimentos seguros e saudáveis.

Finalmente, em sétimo lugar, mas não menos importante do que os motivos anteriores, está a falta de apoio à pesquisa e à transferência de tecnologia aos agricultores familiares que produzem nossos alimentos, vestuário e bioenergia em sistema orgânico. No Estado de São Paulo, os Institutos de Pesquisa da Secretaria de Agricultura e Abastecimento estão voltados para as principais cadeias do agronegócio. A própria agência de fomento à pesquisa estadual, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) tem critérios de avaliação de projetos que restringem o acesso aos recursos para projetos voltados para o sistema orgânico.

A falta de reposição de recursos humanos nos diferentes cargos dos institutos e salários não competitivos com o mercado tem gradativamente esvaziado os Centros de Pesquisa, limitando assim a formação de grupos de pesquisa para o cultivo de alimentos orgânicos e colocando em risco o patrimônio genético dos bancos de germoplasma.

Tudo isso soma para que não tenhamos ainda uma produção orgânica a preços acessíveis para um grupo maior da população.

Em resumo, a certificação da produção orgânica, o período de conversão da área e as barreiras de isolamento com os vizinhos convencionais, a maior necessidade de mão de obra, a menor produtividade e escala de produção contribuem para que os alimentos orgânicos tenham preços mais elevados do que os similares convencionais.

A baixa oferta de produtos orgânicos frente à crescente demanda é o fermento para que o equilíbrio de preços neste setor fique acima do adequado. Os agricultores estão à própria sorte sem assistência técnica qualificada e especializada no cultivo orgânico. Não há inovação sem pesquisa, seja esta feita pelos Institutos de Pesquisa ou pelos nossos agricultores. As cultivares em uso foram desenvolvidas em sua maioria para um sistema de alto consumo de energia e emprego de insumos externos às propriedades.

Pelo lado da pesquisa, apesar da falta de reposição do recursos humanos nos diferentes cargos dos institutos e salários não competitivos com o mercado, existe uma Unidade de Pesquisa e Desenvolvimento em São Roque, ligada ao Centro de Insumos Estratégicos e Serviços Especializados da Apta Regional, que desenvolve pesquisas apenas com agricultura orgânica e busca trazer soluções para que os produtores atendam às exigências legais impostas ao cultivo de alimentos orgânicos em hortaliças principalmente, como o desenvolvimento de uma cultivar de cebola para o sistema orgânico de produção, o consórcio de hortaliças com adubos verdes e a seleção de microrganismos capazes de fixar o nitrogênio atmosférico e disponibilizá-lo para as culturas. Há, porém, muito ainda a ser pesquisado.

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Fonte: Portal Orgânico

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